sábado, 25 de abril de 2009

O que é trabalho

Jaime Oliva

Observando a definição clássica de trabalho nota-se sua grande abrangência. Uma grande parte das ações humanas podem ser enquadradas nesse conceito. A idéia de trabalho indica múltiplas atividades em contextos históricos variados e diferentes sociedades. Vejamos: trabalho é o esforço humano que tem um ou mais objetivos, propósitos e intenções e se refere às modificações da natureza por meio do uso de suas capacidades mentais e físicas. Ampliando ainda mais: o processo de trabalho remete-nos às técnicas através das quais o trabalho humano, empregando instrumentos de produção (simples ou sofisticados) transforma as matérias-primas em produtos de uso pelo ser humano.

Como se pode perceber a definição de trabalho apresentada centra o foco na produção material concreta como sendo o resultado do trabalho. Considerando nossa sociedade há trabalho empregado em serviços tão distintos - com resultados que não têm fisicabilidade - que não podemos dizer mais que essa ação é exclusiva de transformação da natureza e de matérias-primas. Mas, de qualquer maneira, apesar dessa restrição, não há sociedade em qualquer tempo ou lugar que não tenha praticado ou pratique o trabalho tal como ele foi definido classicamente.
Isso nos permite o raciocínio seguinte: se o trabalho é o ato de transformar a natureza e de criar objetos seria justo dizer que o trabalho é uma das fontes produtoras da história dos homens. Segmentos expressivos do pensamento nas ciências humanas dão essa importância ao trabalho, chegando em alguns casos a afirmar que o trabalho é o principio de toda transformação do homem e da natureza. Sem trabalho não há acumulação de bens materiais, nem transformação do espaço geográfico, muito menos a criação de um universo cultural e de conhecimentos.[1]

Entretanto, se sairmos dessa percepção generalizante do trabalho e verificar como concretamente as diferentes sociedades o vem praticando e o entendendo, estaremos adquirindo informações preciosas para aprofundar nossas análises. Um princípio chave deve ser bem assinalado: os modos de se encarar o trabalho são historicamente específicos e correspondem a valores, pressupostos e relações de poder dominantes em cada sociedade. Por exemplo: nem sempre o trabalho foi visto como esse elemento dignificador do ser humano, ao contrário, trabalhar em certas sociedades era um ato degradante, a ser realizado por “homens animalizados“ e, que por isso mesmo, podiam ser vendidos e trocados como mercadorias. E mesmo numa sociedade como a nossa que louva o trabalho sobre todas as coisas, nem todas as formas de trabalho são bem vistas, é o caso por exemplo do trabalho doméstico que, embora essencial à sobrevivência humana, desfruta de baixo status social. É em geral feito pela mulher e não é remunerado. E seria fácil fazer uma grande lista de formas de trabalho que não bem vistas em nossa sociedade.

Outro elemento fundamental para avançarmos em nosso entendimento sobre o trabalho é a chamada divisão social do trabalho. Na medida em que as comunidades e sociedades foram ampliando seus mecanismos de vida coletiva e cooperativa nem todos podiam exercer as mesmas funções no âmbito do trabalho. A forma de trabalho de cada indivíduo ou coletividade passou a ser complementar aos trabalhos de outros indivíduos. Modernamente diríamos que a divisão social do trabalho refere-se à distribuição dos agentes produtores e dos meios de produção entre os diversos ramos e unidades de produção (siderurgia, têxtil, comércio, etc.). E ainda tendo em conta a complexidade de nossas sociedades podemos nos referir também à divisão técnica do trabalho, sendo essa expressão relacionada a divisão das funções dos trabalhadores no processo de trabalho no interior de uma grande empresa, por exemplo.
A importância dos conceitos de divisão do trabalho se justifica, pois é por meio deles que começamos entender como cada sociedade historicamente organiza no plano social seu processo de trabalho, como valoriza algumas funções e desprestigia outras, e assim por diante. Os estudos sociológicos do início do século XX indicavam que as sociedades evoluiriam de forma a multiplicar os papéis no processo de trabalho. Isso porque as sociedades passadas haviam conhecido papéis pouco diferenciados (os indivíduos realizam simultaneamente um grande número de funções). De forma oposta as sociedades modernas se caracterizariam por especialização crescente. [2] (continua)

[1] Esse é o caso, por exemplo, de uma das mais famosas elaborações nas ciências humanas que é a obra de Karl Marx.
[2] Essas teses estão desenvolvidas na obra de Emilie Durkheim que por meio dos estudos sobre a divisão social do trabalho foi o responsável por enormes avanços nos estudos das sociedades modernas de um modo geral. Também Karl Marx e Max Weber interpretaram com brilho próprio as sociedades modernas olhando igualmente pelo enfoque da divisão social do trabalho.

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