terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Geografia Quantitativa: a “primeira” onda de renovação da Geografia

Jaime Oliva

Legitimamente a denominada geografia quantitativa pode ser designada como uma renovação nesse campo do saber. Essa condição ficou obscurecida pela crítica virulenta feita pelos próceres da geografia radical e também da geografia da percepção (humanística). Mas, é sempre bom lembrar, que a idéia de espaço e de espaço relativo deve a essa escola sua presença contemporânea na geografia. Do mesmo modo, uma prática mais rigorosa, em termos metodológicos, passa a ser hábito sob a influência dessa modalidade. Obviamente, seus pressupostos, como tudo em conhecimento, pode e deve ser objeto de crítica. Porém, esta não pode ignorar as aquisições e os avanços, mesmo das correntes que precisam ser em boa medida superadas.
Os precursores dessa escola podem ser identificados, num tempo cujo modo dominante era a geografia regionalista de caráter ideográfico, como designou David Harvey no Explanation in Geography. Vamos indicar dois:
Walter Christaller (1893-1969): geógrafo alemão (também formado em economia). Publica em 1933, Os lugares centrais na Alemanha do Sul. Dessa obra se extrai o que ficou conhecido como Teoria dos lugares centrais. Christaller inova em três domínios: 1. a modelização e utilização de um método hipotético-dedutivo; 2. a interdisciplinaridade entre a geografia e a economia; 3. a pesquisa de uma racionalização do manejo do território nacional. Em sua teoria ele expõe uma tese para a repartição e hierarquização das cidades segundo os níveis de centralidade que elas oferecem; ele encontra “leis” de equilíbrio para a localização dos serviços nas cidades, conforme seu tamanho, seu efeito de massa e por isso sua abordagem é nomotética tendo ainda como referência David Harvey.
Edward L. Ullman (1912-1976): ele contribui com duas abordagens fundamentais, 1. interesse precoce pelas cidades às quais ele dedica um artigo em 1941 “The nature of cities”. Nele há um modelo de organização espacial da cidade chamado “modelo nuclear”; 2. uma abordagem chave para a mudança do paradigma da geografia. Em lugar de considerar o local (o sítio) como fator de localização das atividades econômicas – tal qual na geografia clássica – ele mostra que é a interação entre os lugares que vai permitir se avançar na compreensão dos lugares (interacionismo espacial). São evidentes os ganhos, até hoje de grande validade, que esse entendimento trouxe aos trabalhos de geografia.
Esses precursores de fato influenciaram o que se transformou numa escola de geografia, que aqui no Brasil ficou conhecido como New Geography, assim mesmo, em inglês. Ou também como geografia quantitativa. Trata-se de um conjunto de abordagens geográficas que aparece no mundo anglo-saxão a partir dos anos 1950-60, na França e no Brasil (no IBGE, mais especificamente) a partir de 1970, que “rompem” com a geografia regional clássica. Seu suporte filosófico é o neopositivimo. Isso significa que seus praticantes pretendem obter um estatuto científico calcado nas ciências duras e nas matemáticas, como de resto várias das ciências da época, inclusive outras sociais, também pretendiam. A busca por métodos rigorosos, em geral hipotéticos-dedutivos combinado ao uso de modelos (aqui Christaller é uma forte inspiração, um modelo gravitacional), o uso exacerbado da quantificação e a procura identificar “leis do espaço” (agora entendido como conjunto de lugares) são suas marcas.
A quantificação é uma referência pois toda abordagem em geografia tende a medir, a quantificar os fenômenos e quantificando o que estava implícito, os métodos de estatística de construção da informação geográfica visam dar mais cientificidade ao discurso da geografia. A grande questão que se pode levantar de imediato sobre essa forma de se pensar e praticar a geografia pode ser resumida numa fórmula célebre de Gaston Bachelard: “medir para pensar, ou pensar para medir?” A partir desse questionamento se iniciará a crítica ao quantitativismo na geografia. Essa passará por um severo ataque a desumanização do espaço, reduzido que ficou a manifestações cujo comportamento resultam das leis do funcionamento da matéria.

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